sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009


19 de abril
COM LUCIDEZ!

Yakuy Tupinambá
(Irmã do Mundo)



Aproxima-se o dia 19 de abril e muitos estudantes são levados a pesquisarem sobre nós, indígenas do Brasil, devido à falta de material didático, capaz de transmitir aos alunos da rede pública ou particular de ensino conhecimento sobre cultura indígena.
Em primeiro lugar, existe um equívoco no ensino brasileiro, expresso nos livros de História do Brasil. Lá se fala de um "Descobrimento do Brasil", quando na verdade um território foi invadido, nações inteiras foram dizimadas, milhões de pessoas mortas, em um genocídio de proporções incomparáveis em todo planeta. Aguardamos uma revisão historiográfica, a fim de que seja transmitida a verdadeira história do Brasil.
Não se constrói uma nação sobre mentiras, pois assim jamais um povo se sentirá sustentado em bases sólidas. Sem raízes, não há base sobre o que se sustentar.Nesse período do ano, as escolas públicas costumam "fantasiar" os alunos de "índios", talvez pela falta de criatividade e senso crítico. Com isso, são transmitidas idéias distorcidas e fora da realidade, gerando nesses futuros adultos uma visão equivocada, que promove a segregação.
Nós, Povos Autóctones, habitantes desse continente, não delimitamos ou demarcamos territórios. Cada Nação possui sua organização, umas possuem chefes, outras não. Cada Nação tem suas peculiaridades culturais, seus saberes, sua forma ímpar de lidar com a organização de sua comunidade.
Entre as comunidades indígenas existe algo em comum: a forma de se relacionar com a Natureza, e com tudo que nela existe, porque acreditamos que para haver vida, é preciso cuidar do meio ambiente em que vivemos. Enquanto hoje se discute uma forma racional de consumo, tentando-se a todo custo conscientizar a população da necessidade de preservar o meio ambiente, nós, Povos Autóctones, desde pequenos lidamos com o consumo consciente.
Não somos gananciosos, nem usurários, não acumulamos riquezas, por acreditarmos que devemos viver cada dia como se fosse o último, partilhando o que produzimos, sendo um corpo coletivo. E tudo que aqui existe deve ser cuidado para as futuras gerações.Nossos saberes são muitas vezes hostilizados pela sociedade, somos vistos como primitivos, porém o produto de nosso solo e nossos saberes são usados como matéria-prima pelas indústrias farmacêuticas e de cosméticos.
A "verdade científica" se apropria de uma prática comunitária milenar bebendo na fonte do senso comum.Com a invasão de nossos territórios, somos obrigados até hoje a conviver com as violações que nos foram impostas pelos colonizadores: demarcação de território (impedindo-nos o direito de ir e vir); etnocídio; epistemicídio, ou seja: uma destruição de conhecimentos, idéias e culturas; genocídio (até hoje somos objetos de caça); estupro, miscigenação imposta.
Ainda hoje, somos 230 etnias, e mais de 180 línguas são faladas, em todo território brasileiro, e, no entanto, insistem em usar o tempo verbal do passado, quando falam sobre nós. Descaracterizam-nos, chamando-nos de "índios", pejorativamente, como se não fôssemos humanos, mas simplesmente selvagens.Possuímos religião, moral e ética. Em nossas organizações, não existem sistemas prisionais - cadeias - para punir os que praticam atos delituosos.
Vivemos em comunidade, e não em sociedade: isso não significa que não existam conflitos, mas, cada povo tem sua forma de lidar com eles, sem coação.Se hoje a maioria do nosso Povo não consegue viver dentro dos moldes da civilização ocidental foi devido a um choque de culturas. Mesmo assim continuamos resistindo para manter nossa culturas e tradições. A falta de respeito da cultura ocidental, ainda existente em relação a nós, Povos Autóctones, nos marginaliza.

Deixo aqui um apelo aos pedagogos, professores: Aproximem-se de nós, conheçam a realidade do indígena hoje, transmitam aos seus pupilos uma história mais próxima da verdade, nos colocando em contato, seja nas escolas, seja nas aldeias. Assim transformaremos o dia 19 de abril na esperança de um mundo melhor, onde todos possam estar próximos, respeitando as diferenças existentes!



http://www.indiosonline.org.br/blogs/index.php?blog=4&p=2667&more=1&c=1

2 comentários:

  1. Eu tenho muita honra em conhecer essa Guerreira Yakuy Tupinambá.
    Muitos dão a desculpa da idade, do tempo que passou, do tempo que não têm...
    Yakuy é mulher, esposa, mãe, avó, universitária e, acima de tudo - uma Grande Guerreira!
    É uma das pessoas que mais admiro.
    Grande abraço a todos.

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  2. Esqueceste de um adjetivo: Linda!

    o que vai fora reflete o que levamos por dentro! :>

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